31 de jul. de 2011

A Insustentável Leveza do Ser - Pt. 2

(No último post eu comecei a falar um pouco sobre a relação entre o casal principal do livro: Tomas e Tereza. Ainda há algumas coisas a serem adicionadas sobre eles, mas nunca vai ser o suficiente, porque existem tantos detalhes e segredos escritos nas entrelinhas, que levariam muitos posts para serem desvendados. Mas continuo aqui..)

Já mencionei como eu admiro a maneira que o Milan Kundera desenvolve toda a narrativa, porque ele explica minuciosamente cada parte crucial do livro, através de uma espécie de monólogo dirigido ao leitor..um costume bem machadiano! Já que o livro é repleto de pensamentos profundos e filosóficos, ele explica, muitas vezes, do seu próprio ponto de vista, dá exemplos e retoma essa explicação quando o tema reaparece em outro capítulo.

Outro ponto importante da relação entre Tomas e Tereza são os constantes sonhos dela; são sonhos que se desenrolam como uma estorinha: no 1° deles, para sufocar a dor da alma com uma dor física, ela enfiava agulhas embaixo das unhas, no 2° deles, ela e várias outras mulheres nuas estão marchando ao redor de uma piscina, cantando e flexionando os joelhos. Dentro de uma cesta suspensa no teto, estava Tomas. Caso alguma delas não conseguisse continuar marchando, ele imediatamente dava-lhe um tiro e a mulher caía morta dentro da piscina. No 3° sonho do ciclo, mostrava-a depois de morta, ela estava deitada dentro de um carro fúnebre do tamanho de um caminhão, à volta dela só haviam cadáveres de outras mulheres. Depois da descrição dos sonhos, tem toda uma análise bem freudiana; eles bem claramente representam a insegurança e o medo atroz que Tereza sente das infidelidades de Tomas, de ser abandonada por ele. E, apesar de Tomas não conseguir abandonar a poligamia, ele se culpava e quando Tereza lhe dizia que enfiava agulhas embaixo das unhas, ele sofria junto com ela. Seu destino (ou maldição) era a compaixão, que significa que não se pode olhar o sofrimento do outro com o coração frio, sentimos simpatia por quem sofre. Assim, ele compreendia Tereza, e não somente era incapaz de lhe querer mal, como amava-a ainda mais.

Um dos pontos centrais do livro gira em torno da frase do último movimento do quarteto de cordas de Beethoven: "Muss Es Sein? Ja, Es Muss Sein!", traduzindo: "Tem que ser assim? Sim, tem que ser!". Pelo que eu entendi, todos temos uma espécie de "Es Muss Sein" em nossas vidas, algo semelhante à voz do destino, algo que tem peso em nossas vidas, já que Beethoven considerava o pesado como algo de positivo. E só nos resta aceitar essa ordem, pois temos apenas uma vida, não temos o privilégio de viver outra vez e verificar se erramos ou acertamos ao tomar certa decisão. Tomas sentia que o Es Muss Sein de sua vida era Tereza.

Tomas via Tereza como uma mulher que chegou e tirou sua vida do eixo, já mencionei antes que ele se recusava a dormir com suas amantes, após o ato, levava-as para casa alegando que tinha insônia, quando na verdade não suportava a ideia de compartilhar o sono com uma pessoa estranha, e o constrangedor café da manhã que sucedia a noite. Mas com Tereza foi diferente, ela chegou em Praga de surpresa, e logo depois adoeceu, não lhe deu tempo para "ordená-la" em sua vida. Ela pegou um resfriado, e Tomas a observava dormindo, ocorreu-lhe a ideia de que ela era uma criança deixada a sua porta dentro de uma cesta. Assim, nos é apresentada a imagem que deu origem à personagem na cabeça de Kundera: Tomas está na janela, olhando para a parede suja do prédio em frente, indeciso, refletindo se deve ou não propor a Tereza que ela venha morar em Praga. Se sim, isso implicaria numa mudança radical em seu estilo de vida. Se não, ela voltaria a ser uma simples garçonete de interior, e eles nunca mais se veriam novamente. Essa imagem guarda a chave da vida de Tomas.

Ele então se lembra da noite em que Tereza estava deitada em sua cama, adormecera após ter tido febre. Ele a via de modo diferente, não como amante nem como esposa, mas sim como uma criança indefesa que ele retirara de uma cesta, havia um sentimento muito grande de proteção. Ao observá-la, imaginou que os dois já se conheciam há muito tempo, e que ela morria. Percebeu imediatamente que não sobreviveria à sua morte, apesar daquela ser a 2ª vez que se viam na vida. Olhando a parede do prédio em frente ele compreendeu que não saberia dizer se aquilo que sentia era histeria ou amor. O amor pode nascer de uma metáfora, a metáfora nesse caso seria a imagem de Tereza como uma criança indefesa deixada a sua porta.

A minha intenção principal era mesmo falar só sobre Tomas e Tereza, que são as personagens principais. É claro que a vida deles se envolve com a das outras personagens Sabina e Franz, quem já leu o livro sabe muito bem. Mas se eu for falar sobre eles também, vou acabar redigindo um TCC sobre o livro aqui. Dá pra fazer análises infinitas de cada capítulo da obra, mas eu já fiz o que queria, escrever um pouco sobre as partes mais importantes. Eu sugiro, de todo o meu coração, que leiam o livro, não vão se arrepender. É um daqueles livros que realmente mudam vidas, um dos muitos. Quanto ao filme, gostei bastante da atuação do Daniel Day-Lewis como Tomas e da Juliette Binoche como Tereza. Mas na minha opinião pessoal (e na do Milan Kundera também, ha) podia ter sido melhor adaptado. Acho que eles focaram demais na parte erótica do livro (tanto que o filme pertence ao gênero erótico) e menos na parte "filosófica". Mas é apenas uma opinião.

29 de jul. de 2011

A Insustentável Leveza do Ser - Pt. 1


Depois de muitas conjecturas sobre o que postar, me veio à mente um livro que esteve bem presente na minha vida nos últimos anos. Já devo ter lido umas 4 vezes. Me agrada o jeito como eu encontrei ele, o jeito como eu fui lentamente descobrindo ele, e o jeito como eu continuo percebendo coisas novas, a cada releitura.

O dito cujo é o livro mais famoso do sr. Milan Kundera, nascido lá pelas bandas da Tchecoslováquia. Eu estava fuçando em um armário de livros velhos aqui em casa, e acho esse livro com um formato bem retangular e comprido, com a capa e a fonte um tanto toscas (foto do post), na verdade, o que me chamou à atenção mesmo foi o título: "A Insustentável Leveza do Ser". Acho que até hoje não tenho uma só ideia concreta do que realmente signifique essa leveza insustentável, apenas teorias bem vagas.

Me apaixonei por esse livro não porque eu tenha me achado parecida com algum personagem, mas porque ele é simplesmente belo. O autor consegue descrever cada sentimento e abstrair cada significado de cada conceito de um jeito tão fascinante e filosófico. Eu tenho a mania deselegante (ha) de sublinhar as frases que eu gosto nos livros. E nesse, são tantas "quotes", que deixaria esse post grande demais.

O livro começa com o questionamento sobre o que seria melhor: o peso ou a leveza? seguindo uma linha histórica, Kundera vai apontando as denotações que ambas as palavras ganharam ao longo do tempo. Ele diz: "A contradição pesado-leve é a mais misteriosa e a mais ambígua de todas as contradições". O peso, por um lado, nos remete a algo negativo e difícil, enquanto a leveza seria algo positivo e aliviante. Mas, ele traz a ideia de que nem sempre o pesado é ruim, já que, muitas vezes, só aquilo que é pesado resiste às provações do tempo, só o que é pesado pode ser intenso, e de certa forma, mais real. Já o leve, por sua vez, faz com que a pessoa se torne mais leve que o ar, que ela seja livre, mas também, se distancie da realidade e do sentido original de tudo. Só é grave aquilo que é necessário, só tem valor aquilo que pesa.


Eu acho tão lindo e real o amor que existe entre o 1° casal mostrado na narrativa, e também principal, Tomas e Tereza. Quando eles se conhecem, Tomas é um daqueles caras divorciados de 30 e tantos anos, no ápice da "vida sexual ativa", colecionando inúmeras amantes, porém, sem nunca se apegar a nenhuma, nem dormir na mesma cama após o ato, já que pra ele, "o amor não se manifesta pelo desejo de fazer amor, mas pelo desejo do sono compartilhado (este desejo diz respeito a uma só mulher)." Tereza é uma personagem com um passado opressor, ela sempre viveu em meio a um ambiente que lhe causava náuseas; tanto em casa - onde sua mãe sentia ciúmes dela com o padrasto e a forçava a mostrar seu corpo, dizendo que ele era igual a todos os outros corpos - como no trabalho, passou grande parte de sua adolescência trabalhando em bares da cidade, acostumada a ouvir propostas e frases indecentes de todos os bêbados que frequentavam o lugar. Levou seis acasos para o destino impelir Tomas até Tereza, e talvez seja isso o mais interessante, porque um acontecimento se torna mais importante e carregado de significados quando depende de um número maior de circunstâncias fortuitas.

Continuarei a falar mais sobre o livro no próximo post, esse já tá muito longo!

P.S. : Li essa curiosidade na página da Wikipedia do autor, e achei muito hilária;
"Sua obra principal, "A Insustentável Leveza do Ser" ganhou em 1988 uma adaptação para o cinema, sob a direção de Philip Kaufman e com Daniel Day-Lewis, Juliette Binoche e Lena Olin no elenco. Recebeu 2 indicações ao Oscar e reconhecimento mundial. Desde então Milan Kundera nunca mais autorizou a adaptação cinematográfica dos seus romances."

21 de jul. de 2011

Sincronicidade;

Não existe algo que alegre mais a alma de um ser do que receber notícias de um amigo que não vemos há muito. parece que te revitaliza e te faz maior. saber que ele está contente, que conheceu pessoas novas, com quem pode compartilhar do mesmo sentimento, é como uma calmaria que paira sobre as águas após um profundo mergulho. Vê-lo, então, é a materialização da doce utopia. é a pupila dilatada, o sorriso verdadeiro - que provoca ruguinhas de expressão - o abraço demorado. E então podemos nos sentar, falar sobre bons e velhos dias e o espreitar de uma nova alvorada, ouvir o ritmo de nossas palavras diminuindo cada vez mais seu batimento, até se transformar em silenciosa compreensão. um olhar mútuo contemplativo entre dois corações que se reconhecem.

"this time I know and there's no doubt in my mind. it's forever.."

30 de jun. de 2011

liberte a revolta; (que há em você)

(trecho escrito em um momento de revolta, o qual chamamos, popularmente, de "momento che guevara". ele reagiu com rage against the machine e provocou uma combustão geral. Acho que dá pra dizer que é um pouco pessoal, mas ainda prefiro escrever sob um eu-lírico masculino).

Aqui estou eu; mãe, pai...ao contrário do que as suas preces e pedidos rogavam, me transformei em um rato subversivo, que vagueia pelo submundo dos esgotos fétidos, sempre tentando corroer pelas beiradas o sistema podre que os embala. Não adianta chorar nem amaldiçoar, porque uma vez que a ave da revolução pousa em seu ombro esquerdo, não há mais volta...abri meus olhos para tudo o que há lá fora. Me tornei tudo aquilo que vocês temem e desprezam...Meu poder é minha palavra, meu amor a minha liberdade, meu prazer a poesia. Sou um renegado do lar, o traidor da grande herança, o amante das ruas..e de todas as garotas nuas com seus cigarros à boca. E então eu digo, pai, não tente vir me buscar, não tente me levar pra casa; estou vivendo minha utopia à minha própria maneira agora, a paz de espírito me sequestrou e não há resgate que você possa pagar.
S.Y.

21 de jun. de 2011

Off the Rails;

"we've been keeping each other on this misery diet for so long. it's not fair."

I had been planning to do that for a while now. in every bit of free time I had...in a break for coffee and a cigarrette, in the elevator moving from one floor to another, in the hiatus between lying down and falling asleep. but still, I couldn't figure out a way, the right one, to do it.

as of her, she seemed to be alienated from everything. from our life and troubles together, from the pain left from the weary struggles. she had this bubble of sedatives where she could hide in whenever I dared to start talking about that...

that...I've never been so sure about anything in life, you know? but right now, I knew I needed to end this. I've come to the redundant conclusion that I actually hate her. there was nothing clutching me to her anymore. now it was only this empty, ancient feeling that barely survived in the rooms of our mind. like an old, unwelcome memory you try to get rid of, but still you keep dreaming about it, seeing it...it's called karma, isn't it?

so here I stand, apparently at the last stage of a rehab...where the ex-junkie feels some kind of dawn, breaking inside of him, the resignated state of mind that makes one want to move on. and that's exactly what I had to do. I lit up the last cigarrette from the pack and stood up, walking fast to the exit of the coffee shop, trying to feel something pouring in the air...words, I suppose.

as I walked down the streets, half shivering, half warmed by the smoke, I caught glimpses of her. her devastated face reacting to the sound and meaning of every word I spoke. how she would curse and scream and weep, telling me I'm the great traitor of her happiness. she would think about suicide...homicide, perhaps. and in the middle of the whole scene, she would quote melodramatic, determinist lines, trying to demove me from my one and only decision: to leave her.

seeing that it'd be of no use, she'd finally tell me I'm scum...that I failed to deserve her and all that bullshit I had to hear one million times before. usually, in situations like these, I tend to evade my thoughts, thinking of a song, or a quote from a book that'd fit perfectly to the moment. to the moment I was about to go through, it came naturally to me, whispered: "but it ain't me, babe...no, no, no, it ain't me, babe. it ain't me you're looking for, babe". a folk lullaby sung to the heartbroken ones. but no, not this time. maybe some trashy heavy metal song to cradle destruction and fire. yeah, that'd do.

I was getting really near. only 2 blocks away. in a few minutes, I was going to turn in the corner of the sreet where she lived. I was starting to get chills. maybe it was only the wintertime. I tried to seek for something else inside my head, something that wouldn't make me want to turn back and run to the nearest pub to wash everything off with alcohol. oh, alcohol, where'd I be without you? this made me smile.

but I'm not the character in a movie...these are real relationships, real bullets. do I care about her feelings? no. I don't think she has that. she spends so much time in this half-world, high on her own pain. besides, I really don't give a fuck. I need to live and be a part of the human race...well, in my own way. and this desire for survival has stricken upon my soul so strongly.

I had past the entrance door of the building when I woke up from my inner monologue. I noticed it was 9 o' clock, the close of a silent grey day of november. third floor, I climbed up the stairs, hands on my pocket (seeking for words again), reviving dead and gone times in the corridor, where we once smiled together. I take my time before knocking, fuck, I've delayed this for months, trying to come up with a better way out, but this is it, it's the final cut, the edge of a season.

I knocked, but no one answered. maybe she's out, I'll come back some other time, I just feel like going somewhere dark where they have jack daniels. I forced myself to turn the doorknob, and it was open. I entered. at first glance, everything seemed right, the usual messy room...clothes, books and dolls displayed all over the cubicle. I closed the door and stood there for about a minute, tripping inside my own thoughts. She should be in the bathroom. When I moved my foot to start walking, I notice some stains on the sheets, I take a closer look: they're fresh red. the blood must've been spilled within the last...5 minutes? I'm stuck to ground and breathing fast.

I turn around and see the bathroom door almost closed. nothing else existed in that very moment; all my fears condensed into one single move, one single possibility. just stop thinking and act, you asshole! I took the step till the door and pushed it slowly until it hit the other side of the wall. she was lying there inside the bathtub, with her eyes closed, and the water was deep red. pending from the border of the tub, was her left arm. at that point, any kind of excuse or sound I was trying to make, simply vanished from my psychological reality. I chocked on my own boiling anger.

was she there 'cause of me? didn't I love her enough? I fucking left everything behind just to please her, took every arrow and stone she threw at me for granted, just to make it right. and there she was; bled to death, veins scarred open wide on a hot water bathtub. jesus, how could she do it? that was a stupid question now. warm repressed tears started falling as I tried to drag her outta there, in vain. she felt so cold and heavy in my arms. though that was the first time i think I really felt her, her skin was going to rot in my hands if i stood there yet it felt so true and human.

I couldn't tell if i felt sorry, if i felt angry, if i felt sad or guilty. I can only recall that feeling of smashing reality that took place when i held her cold body, the huge cuts in form of crosses within her wrists. when I touched her for the last time.